quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Perspectiva (V)



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sociedade
e politica
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Uma comunidade prevalece enquanto nela se mantém a solidariedade entre os homens e as mulheres que a constituem, ou seja, enquanto não se manifestam forças centrifugas (desrespeito, desacato, egoismo, desmesura…) que naturalmente surgem sempre que o equilibrio demográfico se torna instável, sempre que o número de habitantes atinge um valor exagerado relativamente ao território ocupado pelo núcleo populacional, ou quando a percentagem de população alógena ultrapassa limites de razoabilidade.

Na Antiguidade grega procurava-se que no conjunto da "polis" os seus habitantes mantivessem activas as noções de harmonia, de equilíbrio e de justa medida, distribuidas pelos indispensáveis valores de coragem (andréia), temperança (sophrosýne), bondade (praótes), liberdade (eleutheriótes), verdade (alétheia), reserva (aidós), justa indignação (gémesis), amizade (philía), piedade (eusébeia) e disciplina (eutaxía).

O desequilíbrio era visto como uma ameaça à sobrevivência de todo o corpo cívico, de toda a "polis".
Ideologicamente, o bem comum suplantava o indivíduo, e uma desmedida (hýbris) poderia provocar uma contaminação (miasma) em toda a sociedade, desestruturando-a, pelo que somente a obediência ao recurso às leis ou aos ritos, poderiam promover a purificação (katharsis) e o retorno à ordem (eunomia).

A "polis" ("cidade-estado" grega), plural "poleis", era composta por um núcleo urbano ("asty") e um território adjacente ("khora") que implicava recursos de subsistência e uma homogeneidade étnica.
A "asty" é a parte da "polis" onde se agrupam os cultos civicos e as instâncias políticas, enquanto a "khora" é composta por pequenas povoações que se denominavam "Paralia" (se na zona costeira) ou "Mesogea" (se em zona do interior).

Este tipo de organização social, pequenos territórios agrupados à volta de um centro urbano, que caracterizou a Antiguidade grega, tem a sua origem em tempos mais recuados em KA.LAM ("o País"), denominação atribuida pelos sumérios ao território que habitavam entre os rios Tigre e Eufrates, e que os gregos baptizaram como "Mesopotâmia", terra no meio" ("meso") dos rios ("potamos").
Ur, Uruk, Lagash (cuja "asty" era Girsu), Umma, Eridu, eram "cidades-estado" do País de Sumer (em sumério KI.EN.GI), povo provavelmente originário do Cáucaso, limitado a sul pelo golfo pérsico e a norte pelo País de Akkad, Akkadu (em sumério KI.URI), habitado por povos semitas.
Como curiosidade, foram os acádicos que denominaram KI.URI como "Shu Me Ru", nome pelo qual ficaram conhecidos os seus habitantes (sumérios).

O permanente cuidado em não permitir um desajustado crescimento dos núcleos urbanos, vai manter o equilibrio comunitário no interior das "cidades-estado", assim como entre elas, durante dezenas de séculos !

Quando a Aristocracia das "poleis" gregas (principalmente Atenas) opta pelo desenvolvimento do comércio como fonte de riqueza, uma das imediatas necessidades foi o aumento demográfico : mais gente, mais "clientes", mais negócio… a crematística tinha nascido !

Desenvolve-se o processo de "sinecismo" (do gr. "sunoikismós", derivado de "sún", com, e "oĩkos", casa, ou seja, "comunidade de casas") pelo qual povoações isoladas se juntam a uma mais importante, ou o fazem entre elas, dando nascimento a novas "cidade-estado".

Pela ausência de controlo demográfico, as comunidades foram crescendo, as necessidades de habitação e alimentação aumentaram e foi-se instalando um grupo social que considerou necessário instituir regras de convivência (obviamente para "bem de todos"), afirmando-se como "classe governante profissionalizada", colocando a "velha classe aristocrática" numa redoma onde podiam contar e recontar as riquezas acumuladas…

Antes de que a finalidade fosse acumular riqueza, as primeiras comunidades eram governadas na verdadeira acepção do termo "governar", ou seja, "pilotar", "dirigir para", conduzir o conjunto da comunidade com uma finalidade que não se esgota no acto de dirigir, mas visa um objectivo claramente definido com antelação.
Mais tarde, quando os governantes assumem que o seu objectivo não coincinde com a finalidade geral, manifesta-se uma ruptura entre governantes e governados, que passam a ser "dirigidos", antes de mais, para a consecução de propósitos próprios de manutenção do poder. Os governantes avocam o direito de comandar, de reger os destinos da comunidade segundo conceitos por eles determinados e passam a actuar com o critério de "dirigentes".

Tinha nascido a "política" (e os políticos) que rapidamente converteram o principio solidário da comunidade em sistema societário competitivo, e lançaram-se em conquistas e em tratos mercantis com a prioritária finalidade de enriquecimento próprio.
Nesses "jogos" de guerra e mercado, as comunidades (convertidas em sociedades) passaram a ser a causa e a consequência das decisões tomadas pela associação dos poderes politico e religioso, "do sabre e do hissope" ("le sabre et le goupillon").

Ao governo colegial "aristocrático" (do gr. "aristos", os melhores) impõe-se a noção de "monarquia" (do gr. "monos", único + "archein", poder), que implanta o regime "monárquico" (do gr. "monarkhikos"), o poder centrado numa só pessoa, que se faz rodear de individuos de confiança, a "nobreza", que tal como o "monarca" (em lat. "rex") adquire direito sucessório.

O "rex", como "chefe de Estado", dirigia directamente a nobreza e, através dela, a generalidade das instituições e da população (em lat. "res publica" - "coisa pública").

A perda do direito sucessório, convertendo o "rex" em "presidente", e a eliminação do poder da "nobreza" em favor de uma classe profissional de politicos", é a diferença fundamental entre os regimes politicos monárquico e republicano, apesar de que, no presente, a instituição monárquica, para sobreviver, aceita compartir a direcção do Estado com formas republicanas de governo que, na prática, detêm o verdadeiro poder politico.
Para as populações, o problema continua a residir em que o "rex" ou o "presidente", apoiados por uma nobreza ou por grupos oligárquicos, mantêm como finalidade primeira o enriquecimento próprio e, por razões de sobrevivência como poder, vão distribuindo "panem et circenses" !

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quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Perspectiva (IV)


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linguagem
como convenção
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Para Noam Chomsky (1928- ), professor de linguística no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), a linguagem está "pré-organizada" na estrutura neuronal do cérebro (cortex cerebral) na qual o "envoltório social" formatea uma linguagem particular.
Assim, todas os idiomas partilham um conjunto limitado de princípios de organização baseado num projecto prévio inerente ao cérebro humano e transmitido geneticamente sob a forma de gramática universal ou plano linguístico para construir a linguagem, razão pela qual as crianças aprendem a falar aproximadamente à mesma idade (5 anos).

Aprender a falar significa dominar um conjunto particular de regras que permitem organizar a linguagem.

A linguagem humana é tão diferente de qualquer outra coisa do reino animal que ele não é entendível como poderia ter-se desenvolvido a partir de gritos ou gestos ancestrais, quando é perfeitamente concebível como efeito emergente das nossas capacidades cognitivas.

Numa sociedade que se inventa em cada instante, o homem permanentemente passa do que sabe ao que ignora, pelo que (por necessidade) deve aprender, innovar, e para concretizar essa finalidade intrínseca necessita de uma ferramenta adequada, recorrendo para isso ás qualidades especificas da linguagem humana.

Apesar da mediocre estima que o filósofo francês Henri Bergson (1859-1941) tinha sobre o "homem falante" ("Homo loquax"), "de que o pensamento, quando pensa, não é mais que um reflexão sobre a palavra", a realidade não nos parece tão redutora, e o pensamento pode (deve) estar na origem da palavra.

A linguagem, como diálogo, como discussão critica, está intimamente relacionada com a faculdade que tem o humano de pensar racionalmente.

O triunfo do "Homo loquax" sobre o "Homo faber", é o da "poiesis" sobre a "praxis", da criação sobre a fabricação.

Para o linguista suisso Ferdinand de Saussure (1857-1913), considerado o fundador da linguistica moderna, "a linguagem é uma forma, não uma substância".
Este simples principio, quase diriamos "esta constatação", é tremendamente importante para a compreensão do módulo "linguagem-pensamento".

Insistindo que uma "lingua" é um sistema do qual todas as partes podem e devem ser consideradas num contexto de solidariedade síncrona, sem o qual não existiria "esse" conjunto linguistico, a "lingua" em causa.

Para Saussure, o "sinal linguistico" (que vulgarmente designamos como "palavra") é composto de duas faces, como as duas faces de uma moeda :
* o significante, ou "forma fónica" (o som) da palavra ;
* o significado, ou "imagem" ("conceito") da palavra.

Assim, o "sinal linguistico" "gato" é composto pelo som produzido pela articulação fónica do termo ("significante") e pelo conceito ("significado") que lhe atribuimos (pequeno animal, coberto de pelos, de grandes bigodes, que mia …).
Da mesma palavra, "significante" e "significado" são inseparáveis, não existe um sem o outro.

"A linguagem é uma convenção..."

Quanto ao poder da linguagem, aqui deixamos este testemunho de "Gorgias", extraido do diálogo homónimo escrito por Platão :

"Refiro-me ao poder de, por seus discursos, persuadir os juizes do tribunal, os senadores no Concelho, os cidadãos na assembleia do povo e em qualquer outra reunião de cidadãos.
Com esse poder, farás escravo o teu médico, teu escravo o mestre de ginástica e, quanto ao famoso financeiro, todos reconhecerão que não é para ele que amontoa dinheiro, mas para outro, para ti que sabes falar e persuadir as multidões."
Platão, Gorgias, ed. GF, 451d-452

Daí o discurso incessante dos politicos, difundido à saciedade pelos ventiladores mediáticos do "Sistema", pretendendo impor um processo de raciocinio crédulo através de uma retórica demagógica fundamentada na aculturação ambiente.

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quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Perspectiva (III)



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pensamento
e linguagem…
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A elaboração de mitos, cultos, doutrinas religiosas e conceitos filosóficos são o preço que o Homem paga para sobreviver como ser racional sem se subordinar a um puro automatismo. As explicações destinadas a fundamentar as ideias, os conceitos e os principios, não são mais que ontogenias desenvolvidas como apaziguadores da angústia inerente à vivência.

Inatalado nos seus instintos de conservação, procriação e gregarismo, pretendendo satisfazer a curiosidade sobre o que o rodeava, das árvores aos animais, dos fenómenos atmosféricos ao movimento incessante da Lua e do Sol sobre as suas cabeças, da água que brotava das rochas, que fluia nos rios e que ondeava no mar, o "raciocínio crédulo" do "sapiens" inferiu a existência de energias conscientes que tudo controlavam.
Curiosidade satisfeita, a superstição impôs-se e não tardaram a surgir os "ventríloquos" das divindades, uns auto-denominados representantes das ditas, hierofantes, pitonisos e magos, classificados como sacerdotes, cada um com o seu próprio receituário e todos impondo o culto ou a doutrina que dizem representar, obviamente (cada uma delas) a única e verdadeira !

O surgimento desses condutores do povo (em gr. "demagogos") é o reflexo de um potencial neuronal, um factor de vital importância que vai magnificar o desenvolvimento da Humanidade : a linguagem !

No humano, a linguagem é inteligência, é capacidade de abstração e de criação.

Se a consciência nos permite a auto-localização no espaço-tempo, o reconhecimento ontológico, a linguagem desenvolve em nós a potencialidade da comunicação simbólica com o exterior através da estruturação do pensamento.

"A linguagem é a casa do Ser", diz-nos Martin Heidegger (1889-1976).

Entre os mamíferos, a linguagem consiste essencialmente na manifestação de emoções, com excepção da linguagem humana que possui a capacidade de veicular símbolos, ideias e noções abstractas, capacidade com base genética, mas que resulta essencialmente da aprendizagem no meio social, da familia à escola, e daí aos núcleos societários mais diversos.

A verdadeira diferença entre a linguagem humana e a animal é a prodigiosa complexidade da primeira.
Complexidade fisiológica que permite, a partir de algumas dezenas de sons fundamentais (produzidos na laringe, um órgão constituído por cartilagens e músculos, alguns dos quais formam as cordas vocais, suspensas do osso hióide), transmitidos com o o ar expirado para a faringe e depois para a cavidade nasal e boca que (graças aos movimentos da língua, véu palatino e lábios), permite a diferenciação dos sons emitidos com uma certa frequência e intensidade, originando os fonemas.

Complexidade psicilógica que permite articular uma linguagem não somente como um processo fisico-mecânico, mas sim algo de bastante mais subtil que necessita de uma intervenção especializada do cérebro, mais concretamente de certas áreas corticais (cortex).

Robin Dunbar, antropólogo e biólogo britânico, desenvolveu o "número de Dunbar" (também conhecido como "Monkeysphere") um conceito com significado sociológico e antropológico que pretende medir os limites cognitivos do número de individuos com os quais uma pessoa pode manter um relacionamento social duradouro. Dunbar teoriza que esse limite tem relação directa com o tamanho do neocortex que limita, pela sua capacidade de processamento, o número de individuos com quem podemos manter uma relação inter-pessoal estável.
O cérebro humano não teria capacidade para manter mais de 150 conexões sociais activas em simultâneo.

Para Derek Bickerton (1926- ), professor na Universidade de Hawai, a "protolinguagem", associando vocábulos, sinais e mimicas, teria passado por fases "pidgin" (língua veicular) a partir da qual se foram construindo as linguagens actuais. Os modelos mentais teriam origem a partir de faculdades primitivas de comunicação e foram evoluindo em paralelo com essas faculdades.

A co-evolução de cérebro e linguagem é também a tese de Terence Deacon, do Departmento de Antropologia da Universidade da Califórnia (Berkeley), segundo a qual a estrutura da linguagem se teria desenvolvido ao longo de um longo processo durante o qual o cérebro e diferentes aspectos da linguagem exerceram "pressões de selecção" uns sobre os outros.
As primeiras formas de pensamento simbólico terão originado um "meio cultural" ao qual o cérebro teve que adaptar-se. E vice-versa !
Terence Deacon sublinha a particularidade do "Homo sapiens" como "espécie simbólica", na acepção de "símbolo" (do gr. "sýmbolon", sinal de reconhecimento) como relação genérica de sentido intencional, ou seja, construida desde um modelo mental da realidade.


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quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Perspectiva (II)


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pensamento
e raciocínio…

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O "Homo erectus" (seguimos a taxionomia de Von Liné), foi uma "produção" que vingou, assim como outras não sobreviveram (e.g. "Homo neanderthalensis"…), e a grande incógnita reside no facto da racionalização das suas funções cerebrais que o transformou em "Homo sapiens" !
Tenhamos presente que existem vestigios na Tailândia do "Homo erectus" datados com cerca de 20 milhões de anos… o que demonstraria (se necessário fosse) que o "berço africano", anunciado pelo "Out-of-Africa", é uma teoria política, não uma teoria ciêntifica !

A grande interrogação que se nos depara concirna o "como e porquê" um cérebro existente há milhões de anos, num relativamente curto periodo, permite ao "lascador de pedras" inventar ferramentas decisivas como o arado e o martelo (ainda hoje utilizados), domesticar animais, tornar-se agricultor, desenvolver uma linguagem e uma escrita e conceber abstracções…
Dizem os sumérios, através de um dos mais antigos textos cuneiformes conhecidos ("Enuma Elish…") que foi obra dos "deuses", uns seres vindos do espaço que alteraram geneticamente um ser elementar ("Homo erectus" ?) obtendo um "ser racional" capaz de lhes servir em determinados objectivos de exploração terrestre.
A partir dos textos sumérios desenvolveram-se diversos conceitos de transcendência divina, cada vez mais distantes do propósito sumério, que estão na origem do judaísmo e seus derivados (cristianismo e islamismo).
Mas, o judaísmo não foi a única interpretação dos testos sumérios, e o "dilúvio", relatado nas peripécias do rei Gilgamesh de Uruk (cidade suméria), aparece igualmente citado nas mais diversas versões desde o Extremo-Oriente às Américas.
A versão original suméria atribui a Ziusudra a façanha que a Tanakh (livro sagrado do judaísmo) imputa a Noé (como obviamente o fazem a Biblia e o Corão)
Não obstante, o "dilúvio", destinado a exterminar o "sapiens" de quem os "deuses" (abandonando a Terra) já podem prescindir, não resultou como pretendido e a espécie humana (com diversas variantes - raças) sobreviveu e foi desenvolvendo os seus processos de raciocinio, agora não dependentes de um qualquer controlo ou manipulação dos "mestres" ("deuses").

O "Homo sapiens", para uns o Adamu acádico (Adam em hebreu), feito de argila e activado por um sopro divino, para outros, um descendente de macacóides africanos, e ainda para outros, fruto de uma experiência genética levada a efeito por extra-terrestres…
Realidade, fantasia, crença… Se o "sopro divino" nos coloca a nivel da metáfora, da parábola e da crença, a origem macacóide transporta-nos para a ficção politico-ciêntifica, para a época em que a maçónica Royal Society of London, da qual Darwin era "felow", pretendia encontrar uma "teoria ciêntifica" com que combater o "criacionismo" defendido pelo cristianismo.
A intervenção alógena não será certamente a única alternativa às duas anteriores, mas é uma alternativa !
Não uma alternativa folclórica, mas proveniente da cultura e civilização suméria, não indo-europeia nem semita, chegada (sem origem conhecida) à Mesopotâmia, entre povos nómadas, há cerca de 6000 anos, e possuidora de conhecimentos de matemática (sistema sexagesimal), de astronomia (conheciam os principais planetas do sistema Solar), técnicas de construção (o "zigurat" de "Etemenanki" atingia cerca de 90 metros de altura por 90 metros de base quadrada), organização social, etc, que surpreendem especialistas como o historiador russo Zecharia Sitchin (1922-), talvez quem melhor conhece a Suméria, o antropólogo Joseph Campbell (1904-1987), autor de "The Masks of God", Pierre Amiet, orientalista e conservador do departamento de "Antiguidades Orientais" do museu do Louvre, o arqueólogo Prof. Henri Frankfort (1897-1954) autor de "Ancient Egyptian Religion", etc…

Os processos de raciocinio do "ser humano" ("Homo sapiens") evoluiram primeiramente como "raciocínio crédulo", supersticioso e temeroso (o que melhor se presta à manipulação), progressivamente demonstrando curiosidade pelo desconhecido, curiosidade que gradualmente, e de forma selectiva, foi evoluindo lentamente para formas de dúvida que exigiam explicações complexas ; o "raciocínio critico" afirmava-se !
Paralelamente, na vivência comunitária, o "ser humano" mantinha intacta a sua tendência instintiva de sobrevivência e reprodução, que manifestava através do egoismo, da violência e da busca do prazer.
Hedonista, crédulo, por vezes curioso, mas sempre "Homem lobo do Homem" ("Homo homini lupus", locução de Titus Maccius Plautus : 254-184 EP) !

Se o "raciocínio crédulo" fundamenta as crenças, a transcendente desde a interpretação judaica das revelações sumério-babilónicas ou a imanente desde as mitologias europeias, indo-europeias e ameríndias, o "raciocínio critico" (muito posterior) é inerente a uma tentativa de interpretação racional da cosmogonia mitológica, um intento que permite transpor o razoamento da simples e passiva curiosidade à formulação activa da dúvida.
Não obstante Carolus Linnaeus (Carl von Liné : 1707-1778). ter brindado a nossa espécie com a denominação de "sapiens", essa circunstância não faz de nós "sophos" ("sábios"), e tão somente, pela aplicação do "raciocínio critico", uns humildes "amigos do saber" ("philos sophos").

Para Dylan Evans da Universidade de West of England (Bristol) as decisões, todas as decisões, são emocionais, pois, na consecução de um raciocinio, a decisão é sempre emocional.
"A presença das emoções é bipolar : estão no inicio e no fim de todos os projectos humanos", como afirma Eduardo Punset in "El viaje a la Felicidad - Las nuevas claves científicas" (2005).

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quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Perspectiva (I)



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o passado
como fundamento
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Talvez seja mais correcto denominar "Multiverso" ao que habitualmente significamos como "Universo", pois cada vez mais a "física teórica" nos aproxima do conceito de "outros Universos" o que é um contra-senso, pois Universo define-se como a totalidade de tudo o que existe.
No âmbito politico, Carl Schmitt (1888-1985) utiliza o vocábulo "Pluriversum" !

Segundo a "teoria das cordas" ("física teórica") as particulas elementares não são "pontos", mas sim "filamentos vibratórios", em forma de pequenas "cordas" cujas extremidades se comportam como particulas.
Uma dessas "particulas teóricas" ("dilaton") estaria na origem de pequenas borbulhas ("pré-big bang") que ao atingir o tamanho de um "proton" entrariam em fase de expansão acelerada ("inflação").
O "big bang" não seria pois um acontecimento inicial, mas a manifestação de um Universo entre outros que se originariam pelo mesmo processo.
Assim, o conjunto seria um super-Universo, ou um Multiverso contendo Universos com as suas próprias leis físicas, o seu próprio tempo e as suas próprias dimensões.

Provavelmente, o modelo de evolução do "nosso Universo", é uma pulsação rítmica entre uma expansão ("big bang) e uma contracção ("big crush")… a que se seguirá outra expansão e outra contracção… e outra… e outra…
Como dizia o francês Antoine Lavoisier (1743-1794) :
"nada se perde, nada se cria…tudo se transforma" !
Tenhamos presente que Lavoisier foi condenado à morte pelo "tribunal revolucionário", da maçónica "revolução de 1789", e executado na guilhotina.
O excelso democrata, Jean-Baptiste Coffinhal, presidente do citado "tribunal", proclamou :
"A República não tem necessidade de sábios nem de quimicos" !

Diz-nos a observação, a experimentação e a teoria que o "nosso Universo" é um composto energético de 5% de matéria visível, 25% de matéria negra e 70% de energia negra ou energia do vazio ("vacuum energy").
E são esses 5% de matéria visível que incluem a matéria inorgánica (a imensa maioria) e residualmente as moléculas de matéria orgânica compostas por um "esqueleto" carbonatado e grupos funcionais característicos de funções químicas (alcool, acido, amina…).
Para que a vida se manifeste é necessário que determinados componentes orgânicos constituam moléculas pré-bióticas, sintetizem e se reproduzam, seguindo um intrincado processo de "acaso e necessidade" que vai gerando sistemas e orgãos que, em condições externas apropriadas, se vão organizando como num "quebra-cabeças", milhões de milhões de hipóteses para conseguir algo de mais complexo e estável.

Afirmava o heleno Demócrito de Abdera (460-370 EP - Era Precedente) que "tudo o que existe no Universo é fruto do acaso e da necessidade" !
O "acaso" fará que do choque casual de particulas energéticas se estabeleçam novos enlaces atómicos que, por "necessidade" de estabilidade fisico-quimica, ocasionarão novas estruturas, e assim sucessivamente até que um equilibrio se manifeste. Os enlaces conseguidos repetir-se-ão sempre que as mesmas condições se verifiquem, tanto a nivel atómico como molecular.
Este principio foi defendido, entre muitos outros ciêntificos, pelo bioquimico Prof. Jacques Monod (1910-1976), prémio Nobel da Medicina (1965), no seu trabalho "Le hasard et la nécessité", publicado em 1970.

É verosímel que, durante os milhões de anos que o planeta Terra tardou em consolidar-se, certas "combinações" pré-bóticas tenham sido até ela transportadas por meteoritos. Nas condições ambientais encontradas o processo de "acaso e necessidade" foi tornando factível a eclosão de seres vivos diferenciados que, por adaptação foram constituindo bio-sistemas de sobrevivência.
Notemos que essas "adaptações" nada têm a ver com as fantasmagóricas hipóteses de Darwin com um pássaro a nascer de um ovo de dinossauro, ou de um humano a descender de um simio.
As "linhas de produção" do "acaso e necessidade", ou falharam no seu "projecto" ou deram lugar a seres que, adaptados ao meio, são hoje o que fundamentalmente sempre foram.
Uma das propriedades fundamentais dos seres vivos é que são dotados de um projecto, o poder de produzir e de transmitir a informação correspondente à sua própria estrutura.

"Os seres vivos distinguem-se de todas as outras estruturas, de todos os outros sistemas existentes no Universo por esta propriedade que designaremos de "teleonomia"
(J. Monot in "Le hasard et la nécessité").

Assim, a Natureza transforma-se e evolui, primeiro pelo "acaso" de acções e reacções, e depois pela "necessidade" de assegurar a funcionalidade encontrada. Essas funcionalidades converter-se-ão em projectos teleonómicos que serão parte de outro projecto mais complexo, como e.g., a visão ou o olfacto que são projectos secundários de um projecto mais amplo e complexo constituido pela estruturação do animal que deles beneficiará.
Realizando projectos subalternos e complementares, a Natureza vai, progressivamente, criando todas as estruturas, todas as funções e todas as actividades necessárias à consecução de um projecto essencial, e nessa actividade, perante uma alternativa, seleccionará sempre a via menos custosa em dispêndio de energia.
Recordemos a teoria de Pierre Maupertuis, as Leis da Termodinámica ou o aproveitamento energético da "respiração celular" !

"A noção de teleonomia implica a ideia de uma actividade "orientada", "coerente" e "construtiva".
Segundo estes critérios, as proteínas devem ser consideradas como os agentes moleculares essenciais das funções teleonómicas dos seres vivos"
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(J. Monot in "Le hasard et la nécessité")

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